Sua origem é motivo de várias discussões e estudos; entre tantas, existe uma delas que os localiza já no livro do Gênesis, quando um descendente de Caim - cuja tradução do nome camita quer dizer escurecido - teve filhos e deles teria nascido aquele que geraria o povo Kalé da língua Catalana (região hispânica da Catalunha), que significa Negro, no trecho do Gênesis onde lemos: "Lamec tomou duas mulheres.....Sela, de seu lado, deu a luz Tubal-Caim, o pai de todos aqueles que trabalham o cobre e o ferro. A irmã de Tubal-Caim era Noema"
Assim, surge um passado histórico muito distante, quando eles abandonaram suas terras por não gostarem de brigas e ter apego a bens materiais e se tornariam errantes, levando consigo sua cultura como maior orgulho e riqueza, e também o ouro, que ainda hoje é uma boa opção para se comercializar em tempos de necessidade.
Os ciganos (corruptela de egpitanos ou corvos do Egito), antes de receberem esse nome de origem européia, passaram pela Índia, de onde adveio forte influência em seu idioma, indumentária e costumes, pois ainda hoje existem muitas semelhanças entre esses dois povos, igualmente milenares em sua cultura. Temos o exemplo da palavra kalí, que é o nome tanto de uma divindade (deusa Kalí do hinduísmo cujo mantra mais antigo já é registrado há 5.000 anos), quanto de lugares ou pessoas negras.
Estão presentes cinco grupos ciganos na Baixada Santista e principalmente em Santos, sendo os Kalderache, Kalon, Matchuáia, Lovári e Sinti os mais numerosos; já outros grupos étnicos são tradicionalmente nômades e - mantendo viva sua cultura e forma de viver, inclusive seus homens se dedicando a trabalhos efêmeros (bicos) e suas mulheres às práticas do oráculo - evitam o sedentarismo e associação com a população. Devido a isso, fica difícil saber quantos são, de onde vieram, a que clã pertencem e quando vão embora.
Existem atualmente os que são chamados de criptociganos, pessoas que sabem de sua ascendência cigana e evitam manter o contato com sua cultura, muitas vezes ignorando propositalmente. Igualmente ocorrem casos em que seus genitores evitam revelar essa origem, motivo pelo qual ignoram a cultura de seus ancestrais ciganos.
Embora os cinco primeiros estejam fazendo parte da população da Baixada, mantêm vivos seus costumes, tradições e hierarquias, inclusive mudando de residência com freqüência, pois não conseguem se manter por muito tempo em um local, cedendo assim aos apelos de seus antepassados e tornando-se seminômades no meio urbano. Muitos são proprietários de lojas, empresas de porte considerável, produzem artesanato e suas mulheres (não todas), realizam a antiga e milenar prática do oráculo, segundo os mesmos desde os tempos de Tubal Cain. (curiosamente, além de seu idioma, os ciganos possuem hino e bandeira, a qual é conhecida mundialmente, pois esse povo está presente no mundo inteiro).
Na história católica, Santa Sarah Kalí ou Negra foi natural da Etiópia, viveu no século I da era cristã. Foi vendida pelos seus conterrâneos como escrava em terras do Egito, que mantinha grandes relações comerciais com a Núbia (N.E.: uma área desértica no Nordeste do atual Sudão) e a Etiópia, sendo comprada por José de Arimatéia. Segundo a Lei Mosaica, ganhou a liberdade e seu sustento trabalhando para as duas Marias que acompanhavam Nosso Senhor. Foi discípula de Jesus Cristo e uma das mulheres que o seguiam e serviam, inclusive participando do cenáculo no dia de Pentecostes.
Quando começou o choque das religiões, entre o judaísmo e o nascente cristianismo, culminando com o martírio do 1º bispo de Jerusalém, S. Tiago (de Compostela), aproximadamente no ano 40 d.C., ocorreu a expulsão dos cristãos dos territórios judeus. Assim banida, foi com outros cristãos jogada num barco, desprovido de qualquer forma de direção e de mantimentos. Então, ela fez uma promessa, de usar um lenço pelo resto de sua vida, se Deus os salvasse do mar.
As correntezas do Mediterrâneo levaram esse grupo até as costas da Camarga na França, onde desembarcaram com a ajuda dos ciganos que estavam passando pelo local (conforme relata a tradição oral daquela região). Ali, deram início à evangelização daquela gente, até sua morte, sendo Santa Sarah, Santa Maria Jacobé e Santa Maria Salomé sepultadas na casa igreja, no local hoje conhecido como Santas Marias do Mar (N.E.: Stes. Maries ou Sainte-Marie-de-la-Mer, na foz do rio Ródano no Golfo de Lion, a meio caminho entre Marselha e Montpellier).
Durante uma reforma no séc XV, suas relíquias foram encontradas e receberam o reconhecimento oficial da igreja em 1448 d.C., no pontificado do Papa Nicolau V. Seguindo as normas da Contra-Reforma, foi canonizada em 1712 d.C. pelo Papa Clemente XI (pois para receber o título de santa ou santo é necessário ser mártir pelo Evangelho ou ter sua vida dedicada à fé crsitã).
Seu culto (dentro de um templo cristão) ficou restrito à França até 1998, quando - na Igreja de Nossa Senhora do Rosário de Santos (antiga Dos Pretos) - ganhou uma pequena imagem, que em 2004 deu lugar a uma de maior porte (seguindo o estilo Românico da Idade Média). Assim, passaram os ciganos a freqüentar essa igreja, onde todo ano (no dia 24 de maio) ocorre missa festiva, com a presença de várias etnias ciganas de Santos, vestidas com suas roupas típicas.
Ocorreu em 21 de outubro de 2006 a inauguração da gruta de Santa Sarah na Lagoa da Saudade, no Morro da Nova Cintra, erguida com a participação do grupo La Gitana e dos cinco grupos presentes em Santos, com a ajuda necessária por parte da Prefeitura Municipal, sendo o prefeito João Paulo Tavares Papa muito homenageado pelos ciganos. A programação começou com missa festiva na Igreja de Nossa Senhora do Rosário às 12h00, quando ao toque de sinos a imagem que representa a Santa no estilo românico, que fica exposta na igreja, foi levada em um andor florido até um carro de bombeiros. Dali seguiu uma carreata pela Avenida João Pessoa, Praça Mauá, Túnel Rubens Ferreira Martins, avenidas Dr. Waldemar Leão, Rangel Pestana, Guilherme Russo e Santista, até a igreja São João Batista.
Da igreja, seguiu em procissão até a lagoa, com as ciganas jogando pétalas de rosas e fazendo gestos de alegria que recordavam a dança flamenga, gritando em romani "Ôtpcha" e "Sastimus" (N.E.: alegria e felicidade.).O cortejo foi recebido com grande queima de fogos e o pároco do local (da igreja de São João Batista da Nova Cintra), padre Caetano Rizzi, fez um breve sermão, em que falou sobre a necessidade de se evitar o sincretismo com a Santa confessora e de se buscar a fé na mensagem de Jesus.
Ele inclusive citou como exemplo a Escritura que a imagem segura na mão direita, bem dentro do pensamento da arte medieval, que procura eninar o caminho para o cristão, e onde se lê em latim "Iesus et via, veritas, vita" ("Jesus é o caminho, a verdade e a vida"), e abençoou a imagem que seria entronizada na gruta, sendo a outra (que estava no andor) levada para a igreja do Rosário e recolocada em seu nicho de origem.
Foi escolhido um cigano que colocou a santa em sua gruta (que igualmente recebeu uma bênção do sacerdote), seguindo-se uma festa onde todos os grupos executaram danças típicas e cantaram, acabando os festejos somente após as 2h00.